Regresso ás aulas

Estava eu a ler a revista Unica (parte do Expresso) da semana passada quando dei de caras com este texto do professor Nuno Crato. Texto que gostei bastante e que passo aqui a reproduzir:

Para os estudantes do ensino básico e secundário o ano lectivo inicia-se dentro de dias. Parece cedo para falar de estudos, de exames e resultados. Mas não é. E numa das disciplinas mais problemáticas – a Matemática! – começar bem é muito importante. Será que as opiniões de um professor de matemática interessam ao leitor? Pelo sim pelo não, aqui vão elas.
Comece-se por reconhecer que a matemática não é difícil. Para muitos estudantes é mesmo a mais fácil das disciplinas. Por uma razão simples: é bem delimitada e percebe-se bem o que se pede. Sabendo-o, têm-se bons resultados. Mas para a maioria dos jovens, a matemática provoca calafrios e lembra maus momentos. Desnecessariamente, pois com um pouco de método e de esforço, tudo se percebe.
O professor conta muito, claro. Um professor que trate a matéria por tu, que saiba explicar bem os conceitos fundamentais, que consiga perceber as dificuldades dos alunos e que esteja disponível para os ajudar… um professor assim é sempre uma ajuda preciosa. Mas os estudantes não se podem desculpar com o professor. Tampouco podem culpar a falta de motivação. Ou o facto de desconhecerem a utilidade do que estão a aprender. Os maus resultados derivam habitualmente de pouco trabalho e, sobretudo, de maus métodos de trabalho.
Para ter sucesso é preciso persistir. Como em tudo na vida. Mas em matemática é preciso trabalhar com uma grande regularidade, todos os dias ou quase todos os dias. Não é com noitadas que se consegue perceber matemática. É com cabeça fria. Uns minutos, ás vezes não muitos, ao longo de todo o ano, desde o principio das aulas.
A matemática tem uma característica que para muitos alunos é ruinosa, mas que não precisa de o ser. Nessa disciplina há precedências claras. Sem se saber o que é um losango não se pode calcular a sua área. Sem se saber o que é uma função não se pode saber o que é uma derivada. Sem se saber o que é um cone não se pode perceber como é a sua secção. E por aí adiante. Isso significa que não vale a pena tentar resolver exercícios de uma matéria sem perceber os fundamentos que a precedem.
A maioria dos estudantes, no entanto, procede ao contrário do que devia. Tenta «praticar», resolvendo exercícios antes de perceber exactamente o que os antecede. Quando não consegue resolver um problema, passa ao seguinte, pensando que talvez seja capaz de solucionar esse outro.
É preciso dizer-se que a mania de «praticar» resolvendo exercícios que não se percebem é uma mania prejudicial. Mais vale perceber bem um problema do que atacar mil que não se entendem. Os exercícios constituem habitualmente a parte final do estudo – ajudam a verificar se se percebeu ou não a matéria. Primeiro é preciso percebe-la. Nunca se deve desistir de tentar perceber.
É verdade, em matemática, tal como em muitas coisas na vida, um dos princípios mais importantes é não desistir. Nunca desistir! E como se faz isso? Faz-se com força de vontade e com trabalho, mas faz-se sobretudo com método. Tal como nas reparações domésticas ou nos trabalhos mecânicos «o material tem sempre razão». Ou seja, quando não se percebe uma coisa não vale a pena passar á frente pensando que se vai perceber a próxima. Quando não se entende, deve-se parar para tentar entender. Se mesmo assim não se percebe, volta-se atrás em vez de se fugir para a frente. E pede-se ajuda ao professor ou aos colegas.
Em matemática, começar bem é muito importante. Desde os primeiros dias de aulas!

in Expresso (revista Unica), 10 de Setembro de 2005

  • Luis Nabais | 2005/09/17 - 20:40

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