Sobre a religião

(ou como ser apedrejado da próxima vez que eu sair à rua)

NOTA: este post serve como resposta ao post “Ora sou católica ora sou…?” no Folha em Branco por isso peguem num cházinho e acalmem-se que isto vai ser longo.

Premissa 1: Deus é infalível.
Premissa 2: A bíblia foi escrita por Deus.
Conclusão: A bíblia é infalível.

Mas e se uma premissa estiver errada? É preciso ter fé dirá alguém religioso.

Uma pessoa religiosa é automaticamente alguém que não responde à lógica. Muitas pessoas enganam-se tentando conjugar ambas a situações mas a partir do momento em que se questiona a verdade de algumas das afirmações da religião é um caminho curto para questionar o resto.

É um facto que a ciência e a lógica por vezes não explicam tudo mas porque razão havia eu de acreditar nas explicações que pessoas menos informadas do que qualquer um de nós hoje em dia tiraram à luz dos seus reduzidos conhecimentos à 2000 anos atrás e originários de zonas onde a fome e a miséria eram o principal problema do dia a dia?

Muitas vezes se interpreta incorrectamente a citação de Karl Marx “A religião é o opio do povo” tentando associar a religião a algo corrosivo quando na verdade o autor apenas desejava associar a ideia de um analgésico, algo que o homem busca quando em desespero e quando não existem soluções para o seu problema.

Para mim cada qual tem o direito a decidir no que quer ou não acreditar, nas ideias e ideologias que quer ou não seguir e como tal oponho-me veemente a coisas como a disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica, aos baptizados, aos crismas, catequeses e todas as demais formas de influenciar menores a acreditarem numa religião como verdade universal. As crianças são impressionáveis até muito tarde (bem até perto dos 20 anos diria eu, mais ou menos dependo da pessoa) e como tal devem ser defendidas de qualquer tipo de doutrinação sempre que possível.

Não digo com isto que as crianças não devam estar cientes da existência da religião, digo até o contrario: o que as crianças precisam mesmo é de saber exactamente o que são as religiões, como funcionam, como se processam e acima de tudo em que fundamentos se baseiam. Que se estude o novo testamento, o velho testamento, o Corão, a carta aberta ao quadro administrativo escolar de Kansas, todos os livros sagrados que for possível. Mas que estudem mesmo os livros, que se investigue bem a fundo todas as mensagens contidas nos mesmos, que não se permita ao clero manter o conhecimento apenas para si guardando com ele o poder de incutir medo nas massas como aquando da idade média.

Eu pessoalmente acredito acima de tudo que todo o universo obedece a regras próprias mesmo que não as compreendamos todas hoje. Até assumo que possamos nunca entender e que possa até existir um ser exterior e que aquilo a que chamamos universo hoje não seja mais do que uma experiência de laboratório, não seria talvez uma ideia tão louca quanto isso dado o tamanho do nosso desconhecimento. Porém acredito que o universo é infinito e como tal nada existe para além dele pois é essa a definição de universo: o todo e nada existe para além do todo.

Mas lamento imenso, não consigo acreditar num ser superior que observa todos os detalhes da minha vida privada e que tem o prazer sádico de castigar ou premiar seres ínfimos perante o seu suposto poder. Lamento mas não consigo. No entanto, e como citava varias vezes um amigo meu, posso não concordar com o que dizem mas defenderei até à morte o seu direito a dizê-lo.

Porém não me peçam para defender a religião organizada uma vez que ela para mim será sempre uma inimiga da liberdade intelectual do homem. Permitam-me desconstruir o sistema pelo qual a religião católica, aquela que eu infelizmente conheço com melhor detalhe, usa para prender as pessoas como carneiros no seu rebanho:

  • Algo de bom acontece -> é Deus que o proporcionou.
  • Algo de mau acontece -> é Deus que castigou.

Notam o padrão? Uma pessoa deixa de ser dona de si mesma. A pessoa deixa de ser responsável pelos seus sucessos: Deus é que lhe permitiu ter sucesso. A pessoa deixa de ter culpa dos erros: foi Deus que permitiu que acontecesse. Foi castigo. A religião é o principal escape dos fracos, é colocar toda a responsabilidade num ser inalcançável, inatingível e, adicionaria eu, imaginário, alguém que acima de tudo não pode responder a acusações nem provar as suas supostas acções. É a desculpa perfeita para colocar na mão de alguns, aqueles que “comunicam” mais directamente com esse suposto Deus, o poder de controlar a vida dos demais efectivamente transformando as pessoas em animais condicionados para agirem de determinadas formas pré-programadas desde infância e provocadas pelo medo desse ser divino todo-poderoso. Eu diria até que a religião não é mais do que a exploração de um gigantesco síndroma de Estocolmo. Os padres católicos chamam-se de pastores de um grande rebanho, quão apropriada é esta analogia visto que pintam Deus como o lobo.

Mas isto leva-nos a outro argumento clássico: o argumento de que é a religião a responsável por aquilo a que chamamos de morais. Eu defendo que a moralidade não é mais do que um conjunto de regras da sociedade que se desenvolveram organicamente ao longo de milénios de interacção humana como forma de sermos mais fortes como uma raça neste planeta tão hostil para nós como infelizmente por vezes somos hoje para ele.

Mas este é um argumento que tenho dificuldade em debater com alguém religioso. Não só o é este como são todos os demais argumentos que possa ter pois como enunciei no inicio desta entrada alguém religioso é alguém que usa o argumento da fé como resposta universal para sustentar qualquer conclusão necessária a manter a sua visão do mundo. Para mim até o mais básico dos argumentos pode ser questionado e por consequência não posso admitir como justificação algo como a fé. Fé é o oposto de raciocínio, de lógica, de dedução. Fé é acreditar cegamente e cego é coisa que eu não só.

Deixo isto aqui à vossa consideração, não planeio com as minhas palavras mudar a opinião de ninguém mas se pelo menos conseguir inspirar mais algumas pessoas a terem o bom senso de fazerem como fez o meu pai e deixar os vossos filhos (presentes e futuros) crescerem sem serem forçados a baptizados e demais cerimonias católicas que apenas servem para inflacionar artificialmente o suposto numero de dos crentes dessa religião neste país então ficarei um pouco mais feliz pelo futuro dessas crianças livres de decidirem por elas próprias.